Archive for janeiro, 2010

Via Campesina entrega a Lula propostas para o Haiti

quarta-feira, janeiro 27th, 2010

Porto Alegre, 26 de Janeiro de 2010

Ao Presidente da República Federativa do Brasil
Exmo. Luiz Inácio Lula da Silva

via-campesina-logoSensibilizada com a enorme pobreza que afeta o povo haitiano, a Via Campesina Brasil enviou uma brigada de solidariedade àquele país em janeiro de 2009, com o objetivo de ajudar a resolver os problema de miséria, fome, analfabetismo, destruição ambiental e escassez de água. Nesse período, identificamos as principais necessidades do meio rural e construímos uma relação fraterna e solidária com o povo haitiano.
Em 12 de janeiro de 2010, como é do seu conhecimento, Sr. Presidente, o mais pobre país das Américas sofreu uma das maiores catástrofes da história. Um terremoto que destruiu a capital haitiana e ceifou milhares de vidas, criando condições que agravam e perpetuam a pobreza. Nesse sentido, a Via Campesina viu-se na responsabilidade de fortalecer a sua solidariedade.
A dimensão gigantesca da destruição nos exige somar esforços e potencializar a ajuda humanitária. Mas queremos ir além da urgente e indispensável ajuda de caráter emergencial. Queremos, como Via Campesina Brasil, contribuir com uma política que ajude a tirar o povo haitiano dessa condição histórica de pobreza.
Tendo em vista que, para aspectos de emergência, os Estado-Nações já estão realizando seus apoios, a Via Campesina se dispõe a trabalhar com 50 mil famílias de camponeses, priorizando nossa atuação no meio rural e nas questões estruturantes. Assim, juntamente com os movimentos camponeses do Haiti, foi construída uma proposta concreta de solidariedade ao povo haitiano, que demanda ajuda do governo brasileiro.

Plano de solidariedade ao povo haitiano:
1 – Estrutura para abastecimento de água para consumo humano, agricultura e pecuária
Visa a construção de açudes e reservatórios, perfuração de poços artesianos e cisternas de polietileno. Necessidades:
1.1 – Dois tratores de esteira, duas retroescavadeiras e dois caminhões (para transporte de máquinas)
1.2 – 50 mil cisternas de polietileno (precisam chegar antes de abril, que é o período chuvoso)
1.3 – Dois equipamentos completos para perfurar poços artesianos.
2 – Fortalecer a produção agrícola de alimentos

Visa enviar sementes, ferramentas e os insumos necessários para a produção dos principais alimentos da população.
Necessidades:

2.1 – Sementes de hortaliças agroecológicas (pimentão, repolho, cebola, alface, cenoura, beterraba, outras), feijão (70 dias), feijão guandu, arroz de sequeiro, sorgo, milho.
2.2 – Ferramentas (enxada, facão, picão, pá, foice, plantadeira manual, etc).
2.3 – Cinco tratores agrícolas 75 HP.
2.4 – Alimentos de necessidade imediata: feijão, arroz, leite em pó, quirera de milho (canjiquinha), etc. Articular apoio por meio da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento).
2.5 – 50 mil fogareiros: no Haiti, a base energética para cozinhar é o carvão vegetal. Com o deslocamento de grande parte da população para o campo, um dos primeiros problemas de escassez será a lenha, pois o país já tem 97% de desmatamento.
3 – Recursos Humanos emergenciais:

Visa garantir a ida de uma brigada de 50 membros da Via Campesina Brasil para atuar emergencialmente no período de seis meses a um ano. Os trabalhos dessa equipe se darão nas áreas de construção de moradias, agricultura, construção de açudes, poços e cisternas.
Necessidades:

3.1 – Garantir deslocamento das 50 pessoas, com a perspectiva de ida no início de março.
3.2 – Garantir a vinda de 120 jovens haitianos para o Brasil, com o objetivo de trocar experiências e estudar no Brasil para que possam retornar e contribuir com a reconstrução de seu país.
Diante dessas demandas emergenciais, vimos por meio desta carta solicitar do governo brasileiro o compromisso nessa tão importante missão de solidariedade aos pobres e explorados do Haiti.
Atenciosamente,

VIA CAMPESINA – BRASIL
MPA, MST, MAB, MMC, CPT, PJR, FEAB, ABEEF, CIMI E PESCADORES

Jesus não é qualificado para ser padre na igreja católica?

terça-feira, janeiro 26th, 2010
O fundamentalismo por vezes leva a grandes contradições

O fundamentalismo por vezes leva a grandes contradições

Não resisti, tive que compartilhar.

Polêmicas mal explicadas no PNDH

segunda-feira, janeiro 18th, 2010

A quem interessa desmoralizar o Plano Nacional de Direitos Humanos

Por João Paulo Mehl

A terceira versão do Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH – 3), lançada pelo presidente Lula em dezembro do ano passado, abarca diversas questões e balançou as mesas de debate nacional e abarca diversas questões. Junto à polêmica gerada, também vieram as evidências da desinformação (por vezes proposital) sobre o conteúdo; ainda assim, o projeto acabou iluminando a discussão ideológica que deve ser o centro da política nacional, colocando em confronto aqueles que acreditam que é preciso avançar no processo democrático, corrigindo injustiças históricas, e aqueles que compõem ou representam a velha e conservadora elite nacional avessa a mudanças.

É preciso pontuar de antemão que o PNDH – 3 não é fruto de interesses de partido A ou B, mas o resultado de mais de dois anos de debates promovidos por audiências públicas, conferências regionais, estaduais e nacional de Direitos Humanos. Estas mobilizaram cerca de 14 mil pessoas, representantes dos diversos setores da sociedade brasileira – tanto no âmbito civil quanto no governamental – em todos os estados da federação. O projeto é o produto de uma revisão do programa inicial sugerido durante o primeiro mandato de FHC, em 1996, em que pontos foram reavaliados e novos incluídos.

O plano prevê a criação de 27 leis e toca em diversas questões, algumas mais polêmicas. No conteúdo, propõe-se a descriminalização do aborto, a proibição da ostentação de símbolos religiosos em locais públicos, direito ao casamento civil de pessoas do mesmo sexo e a adoção de crianças por estes casais e outras propostas na tentativa de reformar pontos conservadores da constituição brasileira. Também abrange direitos dos povos indígenas e quilombolas e sugere o acompanhamento editorial dos veículos de comunicação.

A sociedade propôs e o Governo Lula ousou assimilar propostas amplamente debatidas. Mas sempre que surgem propostas para mudar o status quo, logo aparece a turma do “deixa como está”. Ignorando que o plano é resultado de amplas discussões e segue critérios democráticos, estes setores desinteressados em debater com a população passaram a demonstrar, através da mídia, sua profunda insatisfação com as reformas que o Programa objetiva promover. São grupos isolados que, por interesses específicos, têm feito forte pressão para retirar propostas do plano ou modificá-las de acordo com suas intenções.

Entendemos que a Lei deve ser uniforme e proteger igualmente os seres humanos, em meio à diversidade do nosso país. Sendo branco, negro, índio, LGBT, torcedor do Bahia ou vegetariano, todos são iguais perante a Lei e têm o mesmo direito de se alimentar, receber assistência médica ou ir ao teatro; então, por que é proibido o casamento entre pessoas do mesmo sexo? Qual é a justificativa racional impede um casal gay ou de lésbicas de adotar um filho e construir uma família? Como um conjunto de leis que deve defender e organizar a sociedade exclui, por razões preconceituosas, direitos de grupos historicamente vítimas da discriminação? É preciso combater o preconceito, e esse combate começa por avançar em pontos que nunca foram debatidos em nosso país. Querer conservar esse sistema injusto e desigual é ferir gravemente os direitos humanos.

É preciso seguir firme na proposta inicial do PNDH – 3 e resistir às pressões das elites que, para manter seus privilégios, não têm interesse na justiça social ou nos direitos humanos. No caso da ocupação de terras, a proposta é que só terão poder as liminares de reintegração de posse após a realização de audiência pública para analisar o caso e a função social da propriedade reivindicada. Antes, a reintegração de posse era imediata e geralmente violenta, com o PNDH – 3, haveria critérios socialmente mais justos na avaliação dos casos, como o papel que a terra cumpre na sociedade brasileira: o que produz, para quem produz, por que produz. A intenção é promover uma mediação pacífica nos conflitos agrários e urbanos. Mas setores conservadores do agronegócio, representados no governo pelo ministro Reinhold Stephanes (o mesmo que é contra a óbvia e necessária revisão dos índices de produtividade) e pela bancada ruralista têm demonstrado sua insatisfação com a reforma no plano ao pressionar o governo para retirar essa proposta.

O PNDH – 3 também estabelece a proibição de ostentar símbolos religiosos em locais públicos, para garantir que o Brasil não seja um Estado laico só na teoria. Por respeito à pluralidade de visões e religiões, a proposta de proibir a exposição de artigos que remetam a uma ou outra doutrina serve para não ferir a liberdade de crença. Locais públicos, como o próprio nome sugere, são ambientes que pertencem ao coletivo dos cidadãos e, portanto, certos princípios devem ser observados. Do mesmo jeito que um católico talvez possa não se sentir à vontade com símbolos de outras crenças, um ateu também pode se incomodar com a imagem de um santo. Por respeito a ambos e a todos os outros grupos religiosos, o espaço público deve ser preservado de ostentações particulares de cada doutrina.

Entretanto, dentre as questões mais polêmicas, destaca-se a proposta de criação da Comissão pelo Direito à Verdade. Esse grupo terá o papel de examinar atos de violação dos direitos humanos cometidos durante a ditadura militar. Após pressão do Exército, a solução encontrada foi retirar do plano referências à repressão, mas substancialmente a proposta de analisar e punir os crimes políticos permanece. Preocupa-nos, no entanto, o impacto político deste recuo. A importância desse ponto é finalmente desvendar essa página obscura da história do Brasil, em que centenas de algozes ainda não foram responsabilizados pelas torturas praticadas, e enfim superar a violência institucional. É papel da sociedade pressionar para sejam esclarecidas as barbáries cometidos pelo regime militar.

Não podemos deixar de citar o que a grande mídia chama de “censura” e nós chamamos de controle social de um espaço que é público e não privado, como querem os donos do poder. TV e rádio são concessões públicas, isto é, pertencem a você, a mim e a todo povo brasileiro e por isto devem prestar um serviço público que atenda aos interesses da população, e que segundo a constituição brasileira deve seguir critérios e objetivos que muitas vezes são infringidos. O PNDH – 3 propõe que empresas que veicularem programas que atentem contra os direitos humanos sejam punidas e que seja criado um ranking das coorporações comprometidas com os DH e daquelas que cometem infrações. Oras, quem tem medo de Direitos Humanos?

Existem outros pontos que mereciam uma abordagem mais atenta, mas é importante que se aborde alguns dos mais polêmicos para contribuir com o entendimento público. Refletindo um pouco sobre a conjuntura pós apresentação do plano, vemos que ele explicita o governo de coalisão em que vivemos e deixa claro até onde o governo pode avançar neste modo de governar, limitado pela tal governabilidade. Dos 37 atuais ministros, 31 concordaram e assinaram o plano. Dentro da base governista no congresso a situação é pior; boa parte dos deputados se escondem com medo do impacto eleitoral e outros, ligados aos ruralistas e a setores fundamentalistas, são os primeiros a apedrejar o programa. E o Presidente Lula que assinou o decreto? E a alta direção do Governo? Será que é hora de escutar os marqueteiros de plantão sempre prontos a ponderar para não correrem riscos eleitorais, ou encarar velhas demandas e propor ações efetivas de valorização de direitos?

O Governo não pode ceder mais uma vez e nem abrir mão de convicções históricas da sociedade. O programa é um avanço, e revê-lo, retirando ou amenizando pontos polêmicos, representa uma vitória dos setores mais conservadores da sociedade. É preciso enfrentar a rigidez das estruturas construídas para que se ergam outras, mais justas e democráticas, e que respeitem os direitos humanos. Esperamos que saia do papel as propostas do pacote de medidas que vêm sendo alvo de protesto de grupos isolados que optaram por não fazer o debate dentro das instâncias pré estabelecidas.

Entendo que é de fundamental importância que os movimentos sociais e partidos de esquerda se unifiquem na luta para implementar integralmente o Programa Nacional de Direitos Humanos e pressionem as instituições do governo a fim de que ele seja colocado em prática. Embora ainda haja muita caminhada no que se refere à justiça social, não se pode negar que o programa é um avanço em questão de direitos humanos e poderá mexer em velhas estruturas erguidas para manter a desigualdade em nosso país, basta vontade política!
Vamos às ruas e à luta em defesa do 3º Plano Nacional de Direitos Humanos!

João Paulo Mehl é presidente eleito da Zonal Matriz do Partido dos Trabalhadores de Curitiba, também é associado do Coletivo Soylocoporti e do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social.

Este texto não representa necessáriamente a opinião das organizações citadas, mas a opinião pessoal do autor.